Ela, tal como as outras que são como ela, também viverá ignorada, sozinha, distraída, debruçada numa janela qualquer, aos braços de alguém que a agarre. Deixei de vez de procurá-la, repugna-me aquele carácter incompreensível. Passei horas esquecidas assim, a contemplar as monotonia de seu destino, das suas ambições impossíveis. Assim eram os nossos dias, embebidos numa pasmaceira indefinível, estranho a tudo o que se passava à nossa volta.
As contradições tornavam-na absurda e a falta de carinho algo insuportável. Custava-me vela na desolação dessa apatia, foragida do mundo, sem ter a comoção dos grandes sentimentos que nos prendem à vida, e que são o conforto nas horas do desalento.
É impossível observar mais profundamente o coração desta mulher, isolar-lhe os sentimentos e reproduzi-los numa relação normal. Ela não disfarça a sua personalidade pelo amor de ninguém. Não pensa alto, não deixa ver, não partilha ou conversa, todas as suas paixões são despertadas por desenfreados instintos, que existem igualmente em nós, mas que os moderamos.
Eu cá fico, vestido com uma cor triste e expressão dolorosa. Ela será para sempre uma criança, que chora e ri ao mesmo tempo, como sente mais do que pensa, quer mais do que pode. O amor como ela imagina, só existe nas obras de arte, fora de lá é uma falsidade, uma loucura, algo impossível. O amor pede paixão, como a natureza pede paisagem.
Nunca a vou compreender, o seu riso cheio de ironia desarmava-me. O seu génio, o seu egoísmo, não sei como chamar-lhe. Para ela a gratidão era justificação para a minha submissão. Pobre rapaz! Pobre de mim... Este será para sempre o seu desgosto intimo, que o torna solitário e agressivo, porque viveu amarrado a algo ridículo.
quarta-feira, março 16
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